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A Guerra das Toninhas, por Gabriel Yared

Desde 1822, o Exército Brasileiro, com braço forte e mão amiga, já pintou meio-fio, cortou grama, criou jogo de PC com gráficos de 2001 e matou toninhas.

No dia primeiro de fevereiro as toninhas declararam guerra ao Brasil. Demoraram mais de cem anos preparando a retaliação pelo massacre que sofreram na primeira guerra, mas finalmente estavam prontas para agir.


Preocupados, os cidadãos brasileiros clamaram ao Itamaraty que articulasse negociações de paz, mas o ministro só queria saber de fritar hambúrgueres.


As toninhas chegaram enfim à costa brasileira. Bombardearam o litoral com suas balas de algas, trazendo incômodo aos moradores da Barra.


O capitão convocou o Exército e exigiu que metralhassem, afundassem e acabassem com aquela balbúrdia.


A Marinha não sabia nem o que era toninha, abateu golfinho, peixe-boi e até submarino. Os jatos da Aeronáutica nem chegaram a decolar: teve apreensão da PF. E os soldados da terra, coitados, não faziam ideia que precisavam tirar os óculos de realidade virtual.


De início, ao perder a guerra, nos sentimos humilhados. Mas até que eu gosto de ter deixado o gentílico “gadão” para ser então “estoninhiano”.


Conheça o autor Gabriel Yared



O que te atraiu para a literatura? Você se lembra de quais foram as suas primeiras leituras?

Eu não tinha o hábito de ler além dos quadrinhos da Turma da Mônica até os oito anos, quando meu pai decidiu que era hora de começar a partir pro mundo das palavras desacompanhadas de ilustrações. Ele me presenteou com um exemplar de "Alice no País das Maravilhas" e "Alice Através do Espelho” e “O Que Ela Encontrou Por Lá" que eu tenho até hoje. Foi um encanto imediato, fiquei impressionado com as personagens estranhas e situações surreais que lia. Foi como se realmente visitasse um novo mundo, e é isso que eu gosto até hoje em questão de leitura e escrita: poder viver mais vidas do que a minha própria. E pouco depois de terminar o livro, resolvi escrever o meu próprio: "Turma do Gabriel Teen no País das Maravilhas", que era uma espécie de releitura da obra original com meus amigos e familiares fazendo parte da obra. Depois disso, passei a ler as sagas da moda dos anos 2010: Crepúsculo, Percy Jackson, Harry Potter, entre outros, que me inspiravam a escrever histórias sobre crianças lutando contra monstros, mas perdi tudo quando roubaram meu computador.


Quantos anos você tinha quando começou efetivamente seus escritos? Chegou a publicar essas primeiras histórias?

Eu comecei a escrever com 9 anos. Sobre essa primeira história baseada em Alice, meu pai até pagou a impressão de alguns exemplares na gráfica e a gente fez um evento de lançamento na minha escola, foi divertido. Aos 14, escrevi e publiquei uma fanfic do filme "Hoje Eu Quero Voltar Sozinho" no Nyah!, mas depois disso passei uns anos sem conseguir concluir nada.


E como foi a retomada para a literatura? O que te inspirou a voltar?

Em 2018, com novas influências como o Machado de Assis, o Edgar Allan Poe e o Junji Ito que passei a escrever contos de horror, e acho que foi aí que me encontrei, de verdade, na escrita. A partir de então, tenho escrito até fantasia, ficção científica e histórias românticas com uma pegada mais sombria, sob um olhar pessimista (ou realista) sobre a realidade, até porque eu gosto sempre de abordar temas sociais nas minhas histórias, e a sociedade é difícil.


E nesse interim chegou a publicar algumas obras, né? Quais foram?

O conto "Bem-vindos à Amazônia", saiu na duologia Depois do Fim, da Cartola Editora. Depois de mais algumas participações na Cartola, no começo de 2021 lancei no Kindle a noveleta de terror "Brahum" e fiz parte da antologia mensal “Romances Infelizes”, do selo Um Berro Literário. Ano passado lancei meu primeiro livro autoral: “Semente de Sanque”, uma fantasia sombria e drama familiar que se passa na histórica Vila de Mazagão Velho, no interior do Amapá.


Se pudesse dar um panorama geral das histórias que você já produziu, conseguiria apontar os elementos e as temáticas recorrentes que trabalha? Além disso, existe alguma mensagem que busca passar ou que aprendizagem você mesmo acabou obtendo com sua escrita?

Acho que a principal característica é tratar as dificuldades, felicidades, inseguranças e esperanças do convívio em sociedade, seja as minhas ou as que observo. A família e as agressões que sofremos dentro dela vestidas de amor é um tema recorrente. A homofobia e machismo são temas recorrentes. Ser subestimado por ser nortista é um tema recorrente. Mas também procuro dar a esses personagens e até a mim mesmo uma chance de vencerem essas pressões, esses inimigos que eu apresento, tanto literais, como transformados em criaturas, entidades sobrenaturais, obsessões. Mas nem sempre; pois sou um pessimista (ou realista) e às vezes a esperança está longe da minha escrita e eu lembro aos leitores que o mundo é difícil. Ainda assim, independente do desfecho feliz ou triste que meus protagonistas alcançarão, é certo que farei meu máximo para que o leitor se identifique e tenha empatia para com eles, até como uma forma de conscientização sobre os temas abordados.


Como funciona seu processo de escrita e pesquisa?

Geralmente as histórias surgem para mim como um enredo curto, com partes faltando. Podem ser personagens, criaturas, espaços ou um tema. Meu primeiro passo é colocar o que tenho no papel e tentar completar com uma estrutura que tenha início, meio e fim. Geralmente é aí que entra a pesquisa, para confirmar se o que quero pra história é possível, é verossímil, etc. Com esse mínimo de planejamento, deixo a escrita fluir e descobrir seus próprios caminhos.


Você citou alguns autores como influência, de que forma eles corroboram com a construção das suas narrativas? Há outras influências?

Machado é o que me inspira a tratar temas sociais com certa ironia, admiro muito o autor nesse aspecto. A Poe devo a construção de ambientações que se tornam mais densas a cada linha, imergindo o leitor aos poucos na narrativa e nos efeitos que quero causar. Já em Ito, o que mais gosto e procuro me inspirar é a transgressão do natural ao ponto do abandono da racionalidade, podendo levar o personagem que se depara com inimaginável à loucura.


King também é uma influência para mim na forma como transforma um ambiente familiar, aparentemente seguro à primeira vista, num dos espaços mais perigosos em que uma pessoa pode estar.


Você é editor na revista “Égua Literária”, certo? Acredito que já seja uma revista conhecida do público, mas pode apresentar ela para quem ainda não conhece?

A Égua Literária é uma revista de ficção especulativa da Região Norte. Surgiu com o objetivo de trazer mais visibilidade aos autores nortistas, que, sabemos, constituem a minoria quando se fala em literatura nacional. Na nossa edição de estreia, "O Norte pelo Norte", falamos justamente sobre a necessidade de nos unirmos e nos fortalecermos para que nossa voz seja ouvida. Dessa forma, eu, a Giu Yukari Murakami, o Lucas Lorran, o Felipe L. Cavalcante e o Giann Carlos Monteiro procuramos discutir as questões da nossa região, sobretudo o que envolve a arte, através de artigos e entrevistas, além de abrir editais para a publicação de contos, que é o nosso carro-chefe. Tem sido um trabalho muito legal de descobrir autorias contemporâneas, e gratificante, por ver que muitos autores da Região estão aderindo ao movimento e se inscrevendo nos editais, além de acompanharem e compartilharem a Égua nas redes sociais.


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Revisão por Nox Santos
Edição por Elisa Fonseca
Edição de imagens por Filipo Brazilliano
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