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Inimigos imaginários

Atualizado: 4 de ago. de 2021



Havia um cotovelo esmagando o que restava do meu estômago. Mas era óbvio que de nada me adiantava reclamar. Estávamos todos no mesmo barco. Escondidos em um covil. Ninguém queria correr o risco de ser encontrado. Então, tivemos de ficar em silêncio,

segurando a respiração (pelo menos aqueles que ainda tinham pulmão). Eu, por exemplo, estava sufocando.


Meus músculos respondiam ao toque de tentáculos que escorregavam por cima de meus ombros buscando um lugar para se acomodar no aperto. Grunhidos abafados denunciavam o profundo incômodo das criaturas abrigadas naquele refúgio superlotado. A mandíbula lascada de uma caveira rangia compulsivamente. “Se controla, porra! Cadê seu instinto de sobrevivencia?”


Chiou uma besta fera com o coração exposto. pulsando num ritmo acelerado. De repente, luzes se acendem penetrando as frestas do guarda roupa. Passos abafados são ouvidos no dormitório “Fomos descobertos.”


Tenho certeza absoluta de que o cheiro daqueles que estavam se decompondo foi o que nos entregou. “Ele está chegando perto. Vai nos achar”. Ou teria sido o rastro de seiva que levava até o armário?


Não importava mais. Quando a porta se abrir, não teremos outra escolha

senão invadir o quarto. Mostrar presas e garras. Urrar e agredir para afastar o medo de nós. Criados para sermos monstros. Tínhamos de defender nossa existência, mas nunca tivemos a menor chance contra a imaginação de uma criança.



Conto por Filipo Brazilliano

Edição e revisão por Elisa Fonseca

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