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Vigília (Falso prelúdio), por Pedro Mohallem


Józef Simmler “Death of Barbara Radziwiłł” c.1860

Dormes, enfim. Dormem contigo as horas.

Bela na vida e, após a morte, bela,

em teu pescoço um cacho se enovela

como se te enlaçassem as auroras.


Extática, no entanto, ris... Ignoras

quem és, quem sou... E o riso teu regela

todo o meu ser, que sabe em ti aquela

que a alma das bestas e dos reis pastoras.


Anulo-me se o olhar pouso no teu,

tu te furtas a mim se a mim me invades

— Fora, a rósea falange nos reclama.


Perder-se em si: castigo de quem ama!

Como cantar, Deusa, a quem se perdeu

a ira, a seta e o colapso das cidades?



Conheça Pedro Mohallem


Pedro é um poeta de qualidade excepcional. Participou de algumas antologias, escreveu um livro e traduz com maestria. Sua musicalidade é expressa de forma fluida e harmônica.


Pedro é poeta e tradutor, formado em Letras e atualmente no Mestrado na área de Estudos da Tradução. Em 2019, publicou pela editora Patuá seu primeiro livro, Véspera; Debris, com versos autorais e traduzidos. Também já participou de alguns blogs, revistas e antologias poéticas, como a METEÖRO (Corsário-Satã, 2019) e a Poesia Brasileira em Contracorrente (Mondrongo, 2019).


Redes Sociais


Facebook pessoal: Pedro Mohallem | Facebook



Entrevista



Quando surgiu o interesse pela arte? Como foi o seu primeiro contato?


Minha iniciação na arte se deu pelo desenho: ainda pequeno, tentava reproduzir ilustrações de quadrinhos e jogos que consumia. Cheguei a fazer um curso de desenho na adolescência, época em que também comecei a escrever poesia, mas durou apenas um semestre. Passei a desenhar cada vez mais esporadicamente e a tomar um gosto cada vez maior pelos poemas. O interesse pela escrita despertou em mim de maneira repentina: bastaram dois ou três poemas lidos em sala de aula e outro da autoria de meu pai, declamado de memória por ele, para que eu entendesse que a língua também pode ser arte. Foi quando decidi fazer, eu também, meus versinhos – e não parei mais. De vez em quando ainda rabisco uns retratos, mas a poesia se tornou minha paixão.


Existe alguém em que vc se inspire? Alguma referência ou um ideal que vc procure?


Uma grande referência para mim, como poeta e como tradutor, é Paulo Henriques Britto. Aprendo muito com suas reflexões acerca de dois problemas que enfrento diariamente: o uso das formas fixas na contemporaneidade e o traduzir poesia. É o poeta contemporâneo que mais me influencia atualmente. Para além dele, ando acompanhado de vários dos nossos gigantes, em especial Drummond, Cabral, Ferreira Gullar e Sophia Andresen.


E o que é a poesia para você? Qual o significado dela na sua vida?


Minha poesia representa uma tentativa de me situar entre a língua e o mundo, extraindo algo de belo desse processo. Como há sempre mais perguntas que respostas, meus versos tendem a se esquivar de soluções e concretudes, apoiando-se no incerto. É uma tentativa de moldar os ruídos internos em um som mais ou menos agradável.


Pedro, você tem algum segredo para produzir seus poemas? Como normalmente funciona o seu processo criativo?


Não tem muita regra. Ultimamente venho tomando nota de todas as palavras e expressões que considere interessantes, e às vezes versos inteiros que me surgem, para um eventual uso futuro. Fragmentos da língua pinçados em placas, notícias e conversas alheias tendem a ter um alto aproveitamento na escrita. O processo criativo depende muito dessas preparações cotidianas despretensiosas e da constante fruição de outros artistas, sejam eles poetas, músicos, pintores... Quando um poema me atinge ou uma canção me arrebata, a cabeça reage a esses estímulos produzindo poesia. Não que eu seja totalmente dependente da produção alheia para produzir, mas estar em um meio artisticamente fértil facilita muito o processo. Nem que o poema já saia pronto: pode demorar horas, dias, meses... Como eu disse, não tem muita regra.


O que você acha que falta nos novos escritores?


Ouvi certa vez de um crítico amigo meu que bons escritores deve ser antes de tudo bons leitores. Graças à internet, é possível acompanhar uma porção valiosa da poesia brasileira contemporânea, e quase todo o cânone de nossa literatura está disponibilizado em pdfs de domínio público. Ou seja: material para leitura é o que não falta. Nesse mundaréu de versos, procure um autor que te interesse, se não pelo estilo, pelos temas recorrentes em sua obra, e mergulhe na sua escrita. É fundamental em um primeiro momento desenvolver certa sensibilidade às nuances da língua, ao ritmo e à sonoridade, ao potencial semântico de certas palavras – e isso vem com a leitura atenta, interessada.


É realmente fundamental que a leitura acompanhe a escrita, porque é uma forma de assimilar o conhecimento não é? Como recomenda que esse processo aconteça?


A prática da escrita pode ser concomitante à pratica da leitura, e um bom manual de versificação apresentará um catálogo exaustivo e valioso de tipos de rima, de verso, de estrofe... Tudo para você entender o repertório técnico de seus autores de cabeceira e desenvolver um repertório próprio. Mesmo que não seja de seu interesse utilizar a versificação convencional, esses manuais são importantíssimos para se treinar o ouvido, mesmo – e principalmente – para ler verso livre. Dos manuais mais famosos, creio que o mais fácil de encontrar na internet seja o de Olavo Bilac e Guimarães Passos. Deixo, porém, o de Matheus de Souza Almeida, que leu o de Bilac e muitos outros: Manualzinho de versificação. (formasfixas.blogspot.com).

Algum conselho para novos poetas?


Nesse processo inicial, não tenha medo nem vergonha de imitar os seus autores prediletos, pois a emulação é um tipo bem válido de estudo técnico, e sua própria voz despontará eventualmente.


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